O avanço das criptomoedas

Por Patrícia Travassos é diretora de criação da Prosa Press e colunista de tecnologia e inovação da CNN Brasil

Salvador, 02/05/2022 – Existe uma teoria, já comprovada, de que situações de crise são capazes de catalisar inovações e provar novos conceitos, acelerando tecnologias ou hábitos que, de outra forma, levariam anos para se consolidarem. Um exemplo disso é que a crise na Europa está fazendo com as criptomoedas.

Você certamente já ouviu falar delas, já que estão por aí há algum tempo mas, com a guerra na Ucrânia, começaram a chamar a atenção. Estamos falando de moedas virtuais criadas com o objetivo de baratear e agilizar transações financeiras internacionais. Além de virtuais, são consideradas neutras, porque não são emitidas por qualquer banco central e, logo, não têm fronteiras. O mudo conta hoje com cerca de 15 mil tipos de criptomoedas, sendo o Bitcoin a pioneira e mais conhecida.

Mesmo sem o lastro de qualquer banco ou país, elas autenticadas ou validadas por meio da tecnologia blockchain – uma rede de dados inviolável, que registra de forma descentralizada todas as transações feitas no mundo todo em cripto. Isso significa que, se antes o dinheiro era assegurado por caixas fortes, hoje ele é lastreado por servidores seguros espalhados por várias partes do mundo.

Elas estão ganhando destaque nesse momento porque, durante a guerra, têm sido utilizadas como uma alternativa financeira ao sistema tradicional tanto para os russos quanto para os ucranianos, apesar da altíssima volatilidade. Não é à toa que a Rússia tem quase 11% da população envolvida com esse tipo de investimento e a Ucrânia é o país com o maior proporção de investidores em criptomoedas do mundo, quase 13% da população.

Para viabilizar essa alternativa, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, sancionou às vésperas da guerra a regulamentação para o uso das criptomoedas na Ucrânia. O fato é que, mesmo que as moedas virtuais não resolvam o problema de quem perdeu acesso a suas economias, elas estão se transformando em uma nova rota de fuga, usada como uma ferramenta de proteção de patrimônio, de liquidação de ativos e até mesmo de doação de valores.

O Fundo de Criptomoedas da Ucrânia já arrecadou mais de US$ 60 milhões para as necessidades das Forças Armadas, ajudando a cobrir necessidades urgentes como coletes à prova de balas, equipamentos de imagem térmica, suprimentos médicos, rações secas, capacetes e walkie-talkies. Um ativista americano reuniu 32 artistas que produziram obras em NFT (Non-fungible Token) e conseguiu em 30 segundos arrecadar o equivalente a US$ 1 milhão para ajuda humanitária na Ucrânia.

Os próprios hackers da Anonymous, que assumiram a invasão de 300 sites russos, criaram um fundo para arrecadar bitcoins e conseguiram R$ 44 milhões de reais para subornar o exército russo a abandonar a guerra. Do outro lado, na Rússia, temos um movimento de cidadãos russos liquidando o dinheiro deles nos Emirados Árabes, por exemplo, onde há corretoras fortes.

E esse crescimento tende a se expandir para além das áreas em conflito. Uma pesquisa da Sherlock Communications apontou que a adoção de criptomoedas deve crescer em toda a América Latina. No Brasil, mais de 25% dos entrevistados disseram que vão comprar criptomoedas nos próximos 12 meses, 91% a mais do que os compraram até agora ou 36 milhões de brasileiros.

As taxas se repetem na Colômbia, 22,3% dos indivíduos esperando comprar moeda digital ou token no próximo ano; na Argentina, com 18,4%; no Chile, 16%; no Peru, com 12%; e no México, com 16%. Em todos os casos, a pesquisa mostra crescimentos na faixa dos 200% no volume de interessados nas moedas digitais.

Seguindo o caminho das inovações que se impõem ao mercado, o crescimento do interesse, e dos investimentos em criptomoedas, está obrigando os governos a criarem regulamentações. É o caso do Brasil: em fevereiro a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou um projeto que reconhece e regula o mercado de criptomoedas.

A intenção do projeto é coibir ou restringir práticas ilegais, como a lavagem de dinheiro, evasão de divisa e tantos outros crimes. Para tanto, o projeto prevê que o Banco Central deve fiscalizar as empresas e garantir que o criptoativo possa ser, de fato, uma boa opção de investimento e as criptomoedas, uma alternativa de meio de pagamento, como hoje acontece com o Pix.

Talvez as criptomoedas ainda levassem algum tempo para se estabelecer como alternativas seguras de investimento, mas a volatilidade dos tempos atuais está mudando sua história. É algo que devemos acompanhar de perto.

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