Presidente da Embrapa discute conectividade do agro e cita prioridades em aplicações digitais

Salvador, 18/03/2020 – Três instituições nacionais ligadas ao agro brasileiro uniram-se na semana passada para discutir os grandes desafios, oportunidades e soluções para um dos maiores gargalos da agropecuária nacional: a conectividade no campo. Promovido pelo jornal O Estado de São Paulo, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), o evento foi aberto com uma palestra do presidente da Embrapa, Celso Moretti, que defendeu a importância da conectividade e a aplicação de tecnologias digitais para o aumento da produtividade do agro.

Ele iniciou sua apresentação defendendo mais uma vez o slogan da Embrapa: a agricultura brasileira é movida a ciência. “Isso é algo que vou continuar repetindo sempre para aqui na CNA, no Brasil e principalmente no exterior, que ainda desconhece a revolução que fizemos no nosso país. Em cinco décadas o Brasil foi capaz de criar um modelo sustentável e competitivo de agricultura tropical, sem paralelo no mundo, e totalmente baseado em Ciência. Foi um salto fantástico de produtividade com sustentabilidade”.

Moretti, no entanto, ponderou que se o agro brasileiro, que responde por 1/4 de toda a riqueza gerada no país, quiser dar um novo salto de produção e de produtividade, será necessário investir e ampliar a conectividade no campo, porque o acesso às inovações que o mundo urbano já começa a se acostumar vai depender fortemente da maior conectividade no mundo rural.

Segundo ele, em quatro décadas o mundo assistiu a uma evolução absurda das ferramentas digitais na agricultura. “Saímos de uma situação de mono usuário de computador, da internet comercial, do computador central, da pesquisa adaptativa,  para uma situação de sistemas integrados e complexos, Big Data, Internet das Coisas, robótica, drones, sensores e pesquisa sistêmica. Uma nova realidade, onde a conectividade é a chave para o sucesso”, afirmou. Hoje, 72% do campo brasileiro, segundo dados do IBGE, ainda não tem conectividade.

Pesquisas da Embrapa

Como a pesquisa tem contribuído para o avanço da agricultura digital? “Quase todos os nossos centros de pesquisa tem trabalhado fortemente no desenvolvimento de tecnologia e apoio à agricultura digital”, disse o presidente da Embrapa, citando alguns exemplos que já estão sendo aplicados, como sensores que medem a temperatura do animal e avaliam o conforto térmico sob sol ou sombra, dentro do sistema ILPF;  a detecção de doenças, recontagem de frutos, medição de características em animais, simulação de fenômenos, previsão de safras, monitoramento de logística e transporte, rastreabilidade e suporte à tomada de decisão do produtor.

Celso Moretti também informou que a Embrapa desenvolve pesquisas no campo digital com vários parceiros privados , se aproximando mais do setor produtivo. “Por meio de uma parceria com a Scheffer, por exemplo, instalamos sensores e drones em uma propriedade de Sapezal-MT e conseguimos avaliar uma série de parâmetros da safra de algodão, que vão desde a fertilidade, compactação e condutividade elétrica do solo, presença de nematoides e do bicudo, produtividade, aplicação de insumos, matéria orgânica etc”.

O resultado já consolidado de um parceria com o Instituto Mato-Grossense do Algodão (IMAmt), mostrou que esse monitoramento de fitonematóides na cultura do algodoeiro no Estado, envolvendo 260 fazendas e 2,5 mil talhões, pode possibilitar um aumento de produtividade de 10% na cultura, algo em torno de R$ 27 milhões na produção do MT. “É um exemplo, prático e real, de como o uso da agricultura digital pode contribuir para o desenvolvimento e a sustentabilidade do agro brasileiro”, assegurou o presidente.

Ele também citou que a Embrapa faz parte de um grande projeto internacional de desenvolvimento de agricultura de precisão, abrangendo Brasil, África do Sul, EUA e alguns países europeus, para adoção de sensores avançados do solo, que se conectam com máquinas, que se intercomunicam com centrais e que tomam a decisão se é o momento adequado de se irrigar nas propriedades rurais participantes. “Há ainda um desperdício muito grande de água aplicada na lavoura e essa experiência poderá ajudar a diminuir esse desperdício”, anunciou.

Nos últimos anos, centros de pesquisa da Embrapa já lançaram dezenas de aplicativos que hoje estão disponíveis para produtores rurais de muitas cadeias produtivas. De acordo com Moretti, a agricultura digital movimenta um ecossistema de inovação digital, formado por empresas, agritechs, startups, potenciais investidores, muitas delas estimuladas por hackatons e eventos promovidos pela Embrapa, como o Pontes para InovaçãoIdeas for MilkInovaPork, InovaAvi, Avança Café, Ideas for FarmTechStart AgroDigital. Hoje já existem mais de 1.200 agritechs atuando no Brasil.

Prioridades de P&D

O presidente da Embrapa encerrou sua apresentação expondo quatro prioridades de P&D estabelecidas para que a programação da Embrapa possa avançar nos próximos anos com aplicações digitais. “Uma é a própria Agricultura Digital, onde pretendemos trabalhar mais fortemente com conceitos de plataformas digitais, de dados abertos (open data), identidade digital, blockchain, drones e inteligência artificial”, explicou. Uma segunda prioridade será a Edição Genômica, as chamadas ferramentas de tesouras genéticas, em que o avanço dependerá de maior capacidade de processamento (de alto desempenho) de grandes volumes de dados e maior investimento em bioinformática.

“Em Bioeconomia, precisaremos avançar na questão da visão computacional, em sistemas de gestão e georreferenciamento de biomassa e bases de dados heterogêneas. E por fim, dentro de Sistemas Integrados Sustentáveis, vamos precisar avançar em tecnologias embarcadas, automação, transmissão e comunicação de dados, em Internet das Coisas e em robôs”, anunciou.

Ao final de sua fala, Moretti destacou que na questão da Conectividade, o Brasil precisará reforçar iniciativas como o Plano Brasil Agro Conectado, Conecta Agro, Banco de Dados Colaborativo do Agricultor, unindo ações promovidas pelo Executivo, pelo Congresso Nacional e pela iniciativa privada. “Outra necessidade importante que já passou da hora de construirmos é a estratégia brasileira de  Inteligência Artificial. China e EUA já avançaram nisso e ainda temos uma avenida enorme no Brasil para seguir em frente”, enfatizou. A questão dos currículos nas universidades foi outro gargalo apontado: “Precisamos formar profissionais com novo perfil, unindo Ciências Agrárias, Veterinárias e Florestais com Ciências de Dados, Ciências Cognitivas, entre outras. Precisaremos ainda explorar sinergia entre Agricultura e Cidades Inteligentes, o urbano e o rural. A agricultura digital servindo como ferramenta de inclusão produtiva, tecnológica e social”, declarou. Moretti ainda sugeriu incluir as startups e o capital de risco no modelo de negócios e que será preciso internacionalizar  e explorar oportunidades do fluxo mundial de conhecimentos, incluindo o Sudeste Asiático, nas ações a serem promovidas pelo governo brasileiro.

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